Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.

24 de setembro de 2010

Pra tocar a vida, um blues


Hoje vou mudar de assunto. Pra tocar a vida - se bem que às vezes é a vida que toca a gente - um blues sempre vem a calhar. E esse ponto em que estou, diante de uma encruzilhada de sentimentos, é que volto no tempo, aos meus tempos de graduação, meu primeiro artigo publicado [completo, aqui]. Graças ao grande incentivo de uma professora - Kátia Baggio, um trabalho final de História da América que foi para as páginas da Revista Varia História. Um trechinho:


"A errância não era opção de vida, mas a única alternativa para o bluesman sobreviver de sua música. (...) A estrada é tudo que tem pela frente, ela é o cenário de boa parte do seu cotidiano. Não se olha para trás, pois não há laços que prendam. Na verdade, se o músico se sentir preso, será através do blues que irá romper a ligação (com a mulher amada, por exemplo) e permitir a partida que é inevitável"

Escrevi ouvindo Walkin' Blues do Robert Johnson, e dedico essa postagem aos meus alunos da Univale.

21 de setembro de 2010

Interação

Como 1° "evento" do blog, vamos tentar um negócio "interativo" aqui: 1) Postem aí uma definições de MPB, e/ou lista de artistas que considerem de MPB (só pra ver como a coisa vai ficar confusa...rsrsrsrs) 2) Escalem o time que tá na capa da "Realidade" de 1966 . Quem acertar todos primeiro ganha um prêmio "inventado". Divirtam-se

20 de setembro de 2010

A invenção da MPB


Ando muito negligente com esse blog. É difícil arrumar tempo, mas agora fui meio que obrigado pela marcação de um "evento" amanhã. Vamos lá então. Vou juntar uns relampejos que andei tendo, misturar e ver se dá samba: uma sigla + revista realidade + livros de cabeceira + história cultural. A sigla, não poderia ser mais óbvio, é MPB. Tem certas coisas que parecem ter sempre existido. MPB, por exemplo. Mas aí uma pitada de história e... vemos que essa sigla só aparece em meados dos anos 1960, e seus contornos só serão um pouco mais definidos na década seguinte. Lembrando dois livros que eu adoro (falei dos dois em sala de aula semana passada), A invenção das tradições (Eric Hobsbawn e Terence Ranger organizaram) e A moderna tradição brasileira (Renato Ortiz escreveu), posso dizer que MPB é uma moderna tradição inventada. Categoria que foi ganhando sentido entre músicos, críticos e ouvintes, entre polêmicas e panteões, entre passeatas e festivais. Nas bancas de revista, nas paradas de sucesso. Pensei nessa paráfrase ..."ainda não havia para mim MPB4...". Aliás, até 66, a palavra-chave da música popular brasileira ainda era "samba". Será que deu MPB?