Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.

21 de maio de 2011

"Erros" de português: Me chama

De Vanessa Martins Pinto:
“Aonde está você? / Me telefona/” Dois versos, três erros. Pode? É, desse jeito não será possível ligar, não. Escolhemos esse trecho da música do cantor e compositor Lobão para falarmos dos erros gramaticais nele contidos e também do conceito de adequação lingüística. De acordo com a norma culta da língua, o pronome AONDE só deve ser empregado com verbos que indiquem ação e não estado. Assim, é correto dizer aonde você vai, aonde você está me levando, etc. já que os verbos ir e levar indicam ação. Pelo mesmo motivo, é errado dizer aonde você está, aonde é o lugar, etc., pois os verbos ser e estar são verbos de estado. Para facilitar o uso desse pronome, siga a regra: usa-se AONDE quando eu puder substituí-lo por PARA ONDE. Se a substituição não for possível, usarei ONDE. Portanto, no trecho em questão o correto seria ONDE ESTÁ VOCÊ? Outro erro no trecho citado é o uso do pronome ME ao iniciar o segundo verso. Pela norma culta o correto é colocar o pronome depois do verbo: Telefone-me. É isso mesmo, telefonE e não telefonA. É caso de concordância entre o verbo e a pessoa como já falamos em outro artigo. Se usou o pronome VOCÊ o verbo vai para a terceira pessoa e não para a segunda: telefone eu, telefona tu, TELEFONE ele ou você. Entretanto, veja o caro leitor que, se o autor dissesse telefone-me, a música perderia toda a sonoridade e também o ar de intimidade revelado pelo eu lírico que sente saudades do ser amado. Temos então um problema complexo: o que deve prevalecer a língua ou a poética? Acredito que o bom autor deve ter conhecimento das duas áreas. Há erros gramaticais que não produzem nenhum efeito poético. Esses não podem ser admitidos. Por outro lado, os bons escritores quebram as regras gramaticais com um projeto, isto é, eles visam a um efeito de sentido poético. Essas fugas às regras gramaticais, em textos literários, são admissíveis e, no bons autores, necessárias. A esse fenômeno se aplica o conceito de adequação lingüística. No caso aqui analisado, percebemos que os erros foram cometidos por desconhecimento da norma culta e não como projeto já que apenas um erro produz efeito de sentido poético (a colocação pronominal). Não há liberdade poética que justifique os outros erros.

20 de maio de 2011

No próximo semestre

Estou contente em divulgar que no próximo semestre irei oferecer uma disciplina optativa (1 turma à tarde e outra à noite) chamada "Música Popular e colecionismo". É um jeito de casar estudos de museologia e música popular, juntando interesses e minha trajetória como pesquisador e profissional de museus nos últimos 10 anos. Além dos alunos dos cursos da ECI (Museologia, Arquivologia e Biblioteconomia) acho que seria interessante ter na turma estudantes da Música, da FAFICH, da FALE. Vou solicitar que sejam reservadas vagas de eletiva para isso. Vou botar a ementa e deixo espaço aberto nos comentários para sugestões.
Título: Música popular e colecionismo
Ementa:
O conceito de música popular. Música popular enquanto documento em diversos suportes e formatos: da partitura ao disco de vinil, do videoclip ao digital. Reflexões teóricas sobre coleções e colecionismo. As coleções privadas e públicas: discotecas, arquivos fonográficos, museus de imagem e som, blogs e sítios eletrônicos. Música popular, cultura, consumo e identidade.