Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.

30 de dezembro de 2015

1a c/ a 7a - What Happened, Miss Simone?

Faz tempo que assisti ao trailer e quero ver o documentário What Happened, Miss Simone? Mas enquanto isso não acontece, meu caro amigo Alberto Júnior cedeu essa excelente resenha que compartilho com os leitores do Massa Crítica Música Popular:

"O que aconteceu, senhorita Simone?" Por Alberto Júnior


"A primeira cena do filme é a imagem da cantora confusa no palco, perdida em si mesma, tentando restabelecer o equilíbrio entre o piano e o ajuste do microfone. Pausa de minutos. Ela ali, cumprindo a obrigação do entretenimento, reflexiva em compreender se estava ali por uma função social ou uma ação maior, o da arte, e irritava-se quando alguém da plateia se distraía ou distraía a ela, reagindo com voz de autoridade – sente-se, dizia - preocupada em estabelecer uma questão básica quando se trata de música: o estado contemplativo da audição.
O filme continua a trajetória de vida da cantora, da infância até o fim da carreira. Ser a primeira pianista negra na história dos Estados Unidos foi a primeira obstinação imposta a ela aos 4 anos de idade. Disciplina militar e branca. Em troca, perdeu a juventude. E quando rapidamente mostrou talento necessário para dar prosseguimento ao seu destino veio a primeira frustração: o racismo a negou o direito de estudar na melhor escola de música. Violência simbólica.
Para sobreviver, colocou para fora seu canto. Não era esse o plano. A meta era ser pianista clássica. Passou a ser paga como cantora de jazz. Das melhores. E seu canto se revelou original, bem diferente das outras cantoras negras. A imagem também.
Em todas as fotografias e vídeos que compõem a montagem do documentário, não vemos em momento algum a cantora com cabelos alisados. A imagem é de altivez. Sua moda revelava a elegância africana, com turbantes. O corpo, pelo rigor dos estudos de piano, tinha a postura clássica, pescoço alongado, corpo longilíneo. E o mais forte e característico, uma assinatura visual: o olhar incisivo. Silencioso e incisivo. Assertivo.
Ela casa e tem filhos. O marido torna-se seu empresário, para depois fazê-la sua escrava. Escrava de uma produção musical para alimentar a ganância e ambição pelo dinheiro. Incentiva o sucesso como justificativa para trabalhar mais. Os dois ficam ricos. Compram casas com vários quartos para apenas os dois morarem. A síndrome da servidão ali presente. Ele a estupra. Ela gosta. Associa a violência sexual a um prazer sádico. Ela diz que o ama e reconhece que sem ele estaria perdida na administração da própria carreira. Violência física e material. 


Veio a fúria. A vontade de esporrar e de conquistar liberdade. Os negros que adquiriam conhecimento e organização política em busca de direitos civis também. Conviveu com os principais nomes da luta contra o racismo. Sua música adquiriu a mesma violência. Atabaques e guitarras se aliaram ao som do piano que as mãos velozes, grandes e agressivas da pianista executavam.
Ela aprendeu com a violência o que seria a noção de liberdade. Largou tudo e foi para a Libéria, sua ‘casa ancestral’. Não conseguiu reconstruir os cacos de sua identidade fragmentada e destruída pela violência. Passou a bater na filha. Mudou de lugar novamente. Por optar pela música de protesto, perdeu trabalho e parte do público de massa. Perdeu dinheiro e prestígio.
Ainda assim, ela deixou uma obra visceral. O filme encerra o drama da trajetória de vida conturbada da cantora com um diagnóstico médico de “comportamento bipolar”. Reduziu a complexidade do que é a violência simbólica na vida de uma pessoa, sensível a arte e aos problemas humanos.
A primeira vez que ouvi a voz da cantora foi por um disco de coletânea comprado nas Lojas Americanas (!!!). O objetivo era conhecer melhor quem eram as cantoras consideradas grandes divas do jazz. Só lembro de ter elegido uma de suas gravações como uma das minhas músicas para ouvir em dias tristes: “For All We Know”.
Filme para mim é psicanálise. Mas gostaria que não fosse só comigo e atingisse a muitos amigos e a minha própria família. Se um dia puderem compreender a mensagem. E a mensagem é: não violentem a liberdade de quem você ama.
Fim."

Trailer:
 

26 de dezembro de 2015

MOBY DICK

Depois de algum tempo retomo essa série, procurando narrar um pouco a história por trás da criação das letras de canção que já escrevi. Tenho privilegiado, até aqui, as que já foram gravadas em estúdio e lançadas em disco, porque sinto que minimamente elas estão exposta ao público (independentemente do tamanho do mesmo) e encontraram um estado de realização que serve para despertar o interesse por sua aparição, por sua apresentação desnudada de canção.
Eu estava devendo desde uma postagem anterior tratando da literatura como inspiração para a canção [aqui] contar sobre Moby Dick. Lá se vão muitos anos, efetivamente mais de um década, desde sua feitura. Ela é mais ou menos contemporânea de Carpe Diem, que figurou no disco A Outra Cidade. Meu grande parceiro Pablo Castro ma apresentou, salvo engano em um velho teclado, quando havia apenas a primeira parte. Mesmo tendo a possibilidade de conversar com o parceiro, até imediatamente, costumo tentar entender a música da forma como se mostra nesse primeiro contato e propor, o mais rápido possível, um tema, se ele já não foi definido. E aí aguardo a reação, vejo se o parceiro compra a minha proposta. Embora esteja igualmente aberto a uma contraproposta, digamos assim, tenho sido convincente. 

Essa definição temática pra mim costuma funcionar, na medida em que define um universo de vocabulário, situações, e eventualmente até uma trama e personagens, pois compor depende desse movimento, a partir de um campo infinito de possibilidades, ir reduzindo, definindo, organizando... como fatalmente qualquer construção textual, qualquer representação simbólica. Normalmente tem uma história pra contar, pode ser trivial, pode ser mais pretensiosa... como observou o caro amigo e estudioso das Letras e da música popular Rafael Senra em sua resenha [completa, aqui]:

Se Anterior fosse um disco dos Beatles, as letras do Luiz Henrique poderiam ser consideradas como a porção “mcCartneyana” do trabalho. Seu olhar tem um enfoque mais objetivo, com ares de cronista, que remete a canções do ex-beatle como Penny Lane, London Town, e tantas outras.

Além de ficar obviamente lisonjeado, reconhecer o peso da obra de McCartney na minha formação é inevitável. Certamente vai de encontro a uma tradição vastíssima na letra da canção popular brasileira também, pensando num Noel, num Chico Buarque, num Aldir Blanc, em algumas do Gil, ou entre os mineiros do Clube, umas do Fernando Brant, como Ponta de Areia. Os exemplos poderiam se multiplicar. Claro que tem a ver o fato de eu ser historiador e ter grande apreço pela narrativa que desce ao rés do chão, que vai até o cotidiano e destrincha a experiência social a partir do sujeito. O gosto por esse estilo deve ter relação também com minhas preferências literárias, como por exemplo o romance e o conto dezenovistas, cheios de descrições detalhistas. Escritores como Verne, Machado de Assis, Dumas, Doyle, sempre fizeram minha cabeça. Mas é claro, fazer uma letra de canção para uma música que já existe exige que as palavras se concatenem ao que ela propõe. Vou recuperar uma observação feita pelo Túlio Villaça tratando do disco Anterior em seu ótimo blog Sobre a canção:

Nas canções de anterior, a letra parece estar a serviço do efeito causado pela melodia, e não o contrário. Em Moby Dick, por exemplo, a narrativa quase óbvia dos acontecimentos serve a uma composição com dois climas bem definidos, um majestoso e épico, mas com um movimentos sincopado que balança como um navio sobre as ondas (se com isso se aproximar da dança de forma alguma) e uma movimentada segunda parte, em que o clímax da ação, a caça e o naufrágio falam por si, quase sem a necessidade da narrativa das palavras. [ensaio completo]  

Em parte, foi por aí. Ou seja, ouvindo a primeira parte, certamente me veio a sugestão do movimento de uma embarcação (em algum outro momento, caberá escrever também sobre o fascínio que o mar exerce sobre os mineiros). Curioso que só agora, enquanto escrevo, a "irmandade" de Moby Dick e Carpe Diem se revela esclarecedora do processo criativo... a outra também fala de mar e igualmente teve como fagulha um romance, o Robinson Crusoé de Defoe. Mas se antes foi fagulha, aqui o raio caiu com voltagem altíssima, na sua fulgura matando a charada de uma vez. Era tratar de converter o épico embate entre o capitão Ahab e o cachalote branco do romance de Melville, datado de 1851 [vale uma conferida o mapa incluído na edição primorosa da já saudosa CosacNaify] , numa letra de canção com poucos minutos de duração. Tinha basicamente 3 estrofes, que mais intuitivamente que tudo acabei organizando numa sequência narrativa  que produziu o extrato concentrado do livro. Na 1a. , introdução ao assunto, através da descrição da embarcação e de sua partida. Em cada verso tem algum elemento básico que remete à nau e ao universo da navegação, situando rapidamente o ouvinte no cenário. Na 2a., o eixo em torno do qual se desenrola a história, ou seja, o conflito entre o capitão (que aí é  sinalizado como "eu lírico" da canção, narrando em 1a. pessoa)  e a fera branca. Mas também capta o conflito interno, o embate entre razão e ódio vingativo que está no cerne do personagem Ahab, e que move sua perseguição a Moby Dick, que por sua vez é uma fortíssima representação do instinto animal, das forças naturais e irracionais - e igualmente das forças sociais tidas por irracionais encarnadas pelas massas urbanas, pois uma das possíveis de seu nome é uma adjetivação do substantivo "mob", que podemos traduzir por "turba". Na 3a., cuja forma tem uma variação em relação às anteriores, o momento do embate, do ponto de vista do capitão. Aqui o detalhe interessante, as três estrofes ficaram prontas escarradas de uma vez, botando o barco da canção no rumo que haveria de seguir. O timão voltou para o Pablo, que com mais alguns dias definiu a segunda parte. Com isso retomei, fazendo a letra da 2a. parte a partir do que me sugeria a música, bem movimentada, o que fica acentuado nos verbos que auxiliam a compor uma descrição quase que cinematográfica [na minha retina estava retida a película dirigida por John Huston, estrelada por Gregory Peck e contando com a brilhante aparição de Orson Welles]. Nessa parte da letra a narração é mais de acordo com o livro, ou seja, é assumida pelo marujo Ishmael, o que permite olhar objetivamente, "de fora", o confronto entre o capitão e o cachalote. Aí a história termina, não exatamente como no livro, mas no clímax, em que o animal arrasta Ahab consigo para a morte. Achei uma solução feliz e inusitada nesse verso ambíguo, "e desta feita foi seu fim", pois, finalmente, é o fim de ambos. Uma última nota, curiosa, é que esta letra teve apenas duas alterações. Troquei, na 2a. estrofe, "desprezar" por "recordar", e na 2a. parte, "baleia" por "animal". Aí é que está, eu tinha cometido um erro proposital de prosódia, "e na dorsal da bá-lei-a, fisgou", no qual queria insistir, achando que era uma ousadia formal, sei lá, mas acabei cedendo à sugestão bem mais ajustada do meu parceiro "e na dorsal do a-ni-mál, fisgou", ganhando a rima interna de lambuja. O tempo provou que estava certo e hoje prefiro mil vezes assim, a mudança foi benéfica ao resultado final. Vou deixar esse erro de prosódia intencional para ser cometido em outra ocasião. Talvez compor seja também perseguir uma baleia branca.

Versão voz e violão:







Versão do disco:


Moby Dick (P.Castro/L. Garcia)

Levantar ao convés
embarcação vai zarpar
a vela aberta
o vento do leste
cheiro de peste no ar

Recordar ao revés
minha razão de odiar
a fera branca
a boca da morte
proa ao norte, o mar

Rebentar a meus pés
tripulação a gritar
medo naval
pura encarnação do mal

O capitão ergueu o arpão, jogou
e na dorsal do animal, fisgou
a âncora não segurou, soltou
e Moby Dick a 20 nós levou
O capitão seu coração feriu
e desta feita foi seu fim


6 de dezembro de 2015

Música Popular e Memória III: Como nascem as memórias inventadas

Retomando aqui uma série que andava adormecida, em que convido alguém invariavelmente especial para brindar os leitores do blog com algumas reminiscências que associem sua trajetória pessoal, profissional, etceteral, à música popular, alegremente recebo esse singelo recordo* da querida colega, igualmente pesquisadora de música popular e igualmente historiadora, Miriam Hermeto [gracias!], profa. do Depto. de História da UFMG, e minha vizinha de prédio no campus. 



Como nascem as memórias inventadas
por Miriam Hermeto

Em 2010, já na reta final do meu doutorado e com lacunas de pesquisa efetivas, eu resolvi tentar uma entrevista com Chico Buarque. Temia muito que o contato fosse considerado apenas o desejo de uma fã - o que sou, inconteste, apesar do esforço crítico que a persona de pesquisadora sempre implicou - de conhecer seu ídolo. Mas realmente a entrevista, que eu sabia muito difícil, tinha potencial para resolver questões importantes e dar outras cores à interpretação do fenômeno da "Gota D'Água"...
Encorajei-me, então, e tentei. Surpresa, consegui. Como eu consegui?, isso é história pra outra hora - que, aliás, está contada, de alguma forma, na tese. Fato é que consegui, a partir de uma troca de mensagens por email, primeiro com o assessor de imprensa, a doçura do Mario, depois com o próprio Chico.
E fui, em maio de 2010, entrevistar o Chico, em seu apartamento no Leblon. O episódio da entrevista também é assunto pra outra hora. Falo disso tudo, porque hoje lembrei-me muito do encontro, assistindo ao "Chico, artista brasileiro" - filme lindo, desses que fazem bem à alma. Mas, especialmente, lembrei-me de um eco do encontro, que sempre uso como exemplo pra discutir como as memórias são inventadas.
Poucos meses depois de eu ter entrevistado Chico Buarque, ele deu declarações à imprensa, falando de seu novo disco, em processo de produção. Havia poucas canções finalizadas e a primeira delas era "Nina". Sim, Nina, o nome da minha filhota, então com dois anos, a quem sempre cantei em alto e bom som por aí.
Amigos próximos me chamavam para perguntar se eu havia visto o nome da nova canção. "Claro", respondia. E completava: "sei de nada, só sei que não posso crer que é acaso ser esse o nome depois de ele ter-me conhecido". (Vejam a manobra: não era eu a tê-lo conhecido, mas o contrário!)
Farra pura, é óbvio. Mas, cá entre nós e para consumo interno, "Nina" é canção do Vô Ico (como seus netos o chamam) em homenagem à Ninoca. E ela, quando ouve alguém tocar no assunto, já do alto dos seus seis anos, crê mesmo que é pra ela aquela lindeza.
Não fosse essa heresia suficiente, eu, de minha parte, prefiro crer que a canção é pra mim: eu, disfarçada em minha filha, a inspiração de uma valsa sobre uma mulher russa que o eu-lírico conhece por email, que "anseia conhecê-lo em breve" e que ele também idealiza a distância (obviamente, nesse delírio, Chico nada tem do Vô Ico da Nina). Porque, afinal, sonhar nunca foi proibido. E as memórias, como o próprio Chico disse no depoimento de base do filme, nem sempre são produto de experiência da gente. Podem ser derivadas de experiências de nossos pais, avós, de ancestrais sociais. Ou, emendo eu, dos sonhos...
Taí, pra vocês. Como nascem as memórias inventadas.




*N.E.: sob forte influência da exibição do filme Chico - artista brasileiro.

5 de dezembro de 2015

Um tiro de pistola no meio de um concerto

"A política, numa obra literária, é um tiro de pistola no meio de um concerto, algo grosseiro, mas ao qual não é possível recusar sua atenção"
Stendhal, A cartuxa de Parma. 

Terminei de ler ontem o romance, certamente menos conhecido que O vermelho e o negro, mas igualmente exemplar desse gênero tão do século XIX. Grande ironia reside no fato de ler sobre intrigas de corte, tão passionais, por vezes infantis, e sempre interessadas, enquanto se vive num país cujo ambiente político atual parece digno dos melhores folhetins.
Esse detalhe tem o efeito de colocá-lo ao lado de outra leitura marcante que fiz no ano, Os inimigos íntimos da democracia, de Tzvetan Todorov. Existe aí uma profunda conexão, posta em funcionamento pela experiência histórica do presente,  que nos faz confrontar a natureza e a formação do Estado Moderno e dos regimes democráticos. De um lado tenho um romance cujo pano de fundo são as investidas napoleônicas sobre a Europa absolutista e as reações das aristocracias ao perigo do jacobinismo. Do outro uma análise precisa das contradições próprias daquilo que se tornaram as democracias representativas, inclusive pela maneira com que permitem que interesses de elites políticas e econômicas sejam hegemonizados e se perpetuem dentro das regras do jogo que instalam, traindo princípios basilares do próprio liberalismo clássico que orientou sua formulação.
Como não poderia deixar de ser, tais leituras e o próprio momento que vivemos, impregnam de forma inescapável os impulsos de criação que eventualmente me acometem nestes dias. Na verdade não sei onde estão exatamente as fronteiras entre o historiador e o compositor, e isso não chega a ser importante. Acabo achando que essa mistura produz algum resultado.  Gosto muito de pensar sobre o engajamento político no âmbito da canção. Ontem mesmo vi uma paródia de Cálice (Gilberto Gil e Chico Buarque) empregada pelos estudantes paulistas que bravamente desafiam os desmandos do atual governador de seu estado, que demonstra a força dessa alquimia (vou ter que jurar que não me ocorreu a ironia de empregar essa palavra...).
Já faz alguns dias [precisamente, em 04 de outubro] - antes, portanto, dos desdobramentos advindos do gesto torpe de Eduardo Cunha, atual presidente da Câmara dos Deputados, de acatar o pedido para abertura de processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff, comecei a letra de uma canção que pretende versar de alguma forma sobre o turbilhão em que nos encontramos. Chamei-a de Inimigo íntimo. Agora o meu parceiro Pablo Castro começou a fazer a música e assim vou deixar para dar mais detalhes quando estiver definitivamente pronta. O que posso adiantar é que de alguma forma me atrai a ideia de escrever letras com fundo político mas que não sejam tão literais, tão conjunturais, a ponto de deixar a canção datada ou dificultar sua apropriação em outros contextos. Mas, finalmente, o que se pode fazer em relação a isso é muito pouco, pois é decisivo o papel dos ouvintes naquilo que se pode chamar de contexto social de audição, como bem demonstra a imagem acima. A literatura, a história, a vida, inspiram, não apenas quem escreve as canções, mas também quem as ouve.

4 de dezembro de 2015

Entre o Divino e o Paraíso

Ontem, uma noite memorável para comemorar a conclusão de um semestre muito atípico, mas com as suas recompensas. Depois de um dia longo de trabalho e um nó górdio no "sistema" que dei e obviamente não posso desfazer por minha conta, fui ao Palácio das Artes/Sala Juvenal Dias para assistir a ousada performance - que teve sopro, terra, televisão, vídeos mucho locos, mas, sobretudo, fortes canções, lindas interpretações e extrema musicalidade - de uma dupla Kristoff Silva​ + Thiakov Davidovich​  que não seria suficiente chamar de dinâmica. Se Quentin Tarantino receber minhas ondas telepáticas e fizer um futuro longa no Brasil, eles estarão na trilha e no elenco. Não poderemos viver mais sem o Dois na quinta. Parabéns tb ao BDMG, que banca. Quando um banco faz algo de bom nesse mundo, é pra elogiar.

Pensam que acabou? Não, tava só começando...
Dirigi-me em seguida para Santa Tereza, capital mundial do Clube da Esquina, para assistir ao meu parceiro e grande amigo Pablo Castro desfiar, por algumas horas em que o tempo ficou suspenso, seu repertório impecável de canções do Clube, umas 35, segundo contas, entre antenas como Travessia ou Amor de Índio a lados B ou além, como Como o machado, a que ouvi cantando de olhos fechados, literalmente tomando por sua beleza estranha e única. Foi no QG/bar do museu do Clube da Esquina, para o deleite de um público completamente devotado a essa obra grandiosa, e também para o de nosso admirado Márcio Borges, cuja empolgação é uma tradução cabal da perenidade e vitalidade do que o Clube representa para as gerações seguintes. No intervalo fomos ali esticar as pernas e trocar uma ideia, uns reles metros acima de uma certa esquina. Acho que dá pra imaginar, é literalmente ficar entre o Divino e o Paraíso


No segundo tempo, teve também a ótima participação do Fred Borges, dividindo as vozes com o Pablo em mais uma leva de pérolas do Clube.

Mas tem um bônus que eu não posso deixar de mencionar, a grata surpresa de ver este blog, citado pelo Pablo na matéria sobre o show feita pelo Estado de Minas, no contexto da Semana do Clube da Esquina:

"Pablo Castro está tão ligado aos artistas mineiros, que escreveu a apresentação dos songbooks de Lô Borges e Beto Guedes, em 2013. Em parceria com o professor da UFMG Luiz Henrique Garcia, realizou a série As 30 mais geniais do Clube da Esquina, um conjunto de textos no qual comenta composição, harmonia, letra e referências de cada uma das canções. A série está disponível no blog www.massacriticampb.blogspot.com.br e já virou até referência bibliográfica." [matéria completa, aqui]

É mole ou quer mais?
 

1 de dezembro de 2015

Grandes encontros da música popular brasileira: Jards Macalé e Alceu Valença no aeroporto

Macalé e Alceu, reunidos pelo acaso, ou pela desorganização aeroviária, ou enfim por ambos. Enquanto alguns aproveitam o sopro da música, outros preferem o pálido brilho das telas de LCD.