Cerejas
Silêncio
 
 A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
  Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem  bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de  algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de  concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas.  De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e  recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica,  repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de  encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima  farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr,  senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na  odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da  vida." 
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.
 
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