Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.

5 de agosto de 2021

Tinhorão (em memória): o Policarpo Quaresma que deu certo

Quem pesquisa música popular brasileira tem que passar, obrigatoriamente, por José Ramos Tinhorão... polêmicas à parte, ou não, era o maioral. Todos temos uma dívida com ele. Inegável seu impacto, no que erra e no que acerta. Sua contundência me agrada, mesmo quando discordo dele, porque não é mera performance, é embasada em sua pesquisa e visão de mundo [só a título de exemplo, sua crítica sobre o show Opinião]. Reconhecer isso não significa evitar dizer que é preciso reparo e revisão de coisas que ele fala. É necessário, inclusive para honrá-lo, fazer isso, desde que de modo consequente e sustentado.
Um pequeno caso curioso, eu num concurso desses da vida, acho que o que fiz pra uma vaga na UFU, acho que sortearam um ponto sobre historiografia, me deu na veneta fazer uma aula sobre historiografia da música popular brasileira, e tinha o Tinhorão entre os principais autores analisados. Eu certamente escolhi o tema para a banca errada kkkkk, mas saí da prova de didática convicto de ter dado uma baita aula rsrsrsrs. Depois dessa aprendi uma lição sobre escolhas de temas para aulas de concurso kkkkk.
Que bom que há muitos livros e outros registros do conhecimento reunido pelo Tinhorão. Dá pra sacar o estilo com essa palestra proferida por ele e registrada pelo MIS-RJ em junho de 1973.



Que saibamos fazer jus, mesmo que seja para contradizê-lo. Uma pena que o acervo dele foi parar no IMS - por mais que esteja bem cuidado lá - deveria estar num Museu da Imagem e do Som público - por mais que estejamos testemunhando os efeitos nefastos da negligência calculada sobre nosso patrimônio cultural no momento. O Brazil não merece o Brasil... façamos por onde merecer.




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