Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.

21 de agosto de 2017

Efemérides discográficas - um resumo das atividades







Na última sexta-feira, 18 de agosto, aconteceu na ECI / UFMG o evento Efemérides Fonográficas: discos, patrimônio cultural e memória, organizado por mim e realizado pelo PPG - Ciência da Informação, com apoio da Diretoria da ECI e do grupo de pesquisa Estopim [Núcleo de Estudos Interdisciplinares do Patrimônio Cultural], coordenado por mim e pela profa. Rita Lages Rodrigues (EBA/UFMG). Fiz um breve resumo das atividades para deixar o registro e dar uma ideia de como foi a quem não pode ir. 


Pela manhã, de 9:30 – 11:30, a  Profa. Dra. Veronica Skrimsjö, da Liverpool Hope University proferiu a palestra "Popular music record collecting: aesthetics, identities & practices". A profa. abordou o universo do colecionismo de discos de vinil no Reino Unido, os perfis sociais dos colecionadores, considerando variáveis como classe, geração, gênero e práticas colecionistas, incluindo formas de organização e de aquisição. Discutiu ainda o fenômeno mercadológico da retomada de fabricação dos discos de vinil e o impacto das novas tecnologias de digitalização e acesso à música gravada em portais e redes sociais na internet.
À tarde, entre 13:30- 15:30, ocorreu a palestra: Os 50 anos de Sgt. Pepper: uma análise contextual e lítero-musical, do Prof. Dr. Lauro Meller, da UFRN. O prof. tratou do disco Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band dos Beatles, cujo lançamento completou 50 anos. Apresentou uma análise abrangente do ponto de vista contextual e lítero-musical, acompanhada da audição das faixas, desde a composição das canções, passando pelo intrincado processo de gravação, a confecção da capa, o lançamento e a recepção por parte de crítica e público. Dedicou-se a esmiuçar o debate em torno da caracterização de "disco conceitual" atribuída ao LP e da fortuna crítica do mesmo.
Por fim, entre  16:00- 18:00, proferi a palestra "Efemérides e patrimônio na música popular – Disco do Tênis (Lô Borges, 1972)". Discorri sobre o primeiro LP gravado por Lô Borges há 45 anos, que ficou conhecido como Disco do Tênis por sua capa. Após uma breve introdução sobre o conceito de Efeméride, partindo de sua etimologia, caracterizei o disco como artefato e explorei suas dimensões culturais, sociais e históricas. Através da apreciação de trechos e faixas, apresentei uma síntese crítica do disco ao longo de sua trajetória histórica, envolvendo a perspectiva do próprio compositor, de outros músicos e incorporando as percepções do público através de comentários publicados no portal You Tube. Por fim destaquei o Show de Reconstituição do Disco do Tênis, em que seu repertório é tocado com a maior fidelidade possível às gravações originais, discutindo as repercussões dessa proposta do ponto de vista do debate sobre memória social, mercantilização da nostalgia e a noção de atualização do patrimônio cultural.

Um balanço:
Efemérides discográficas foi acima de tudo um êxito naquilo que mais se propunha a fazer, propiciar discussões de qualidade, com maior tempo de apresentação e debate, promover intercâmbio entre áreas de conhecimento e instituições, democratizar o conhecimento atingindo público diverso, incluindo estudantes de graduação, pós, colegas professores, egressos, interessados, colecionadores, músicos, amig@s. Claro, lendo assim parece que foi muita gente. Não foi. E nem de perto o tanto que eu gostaria, mas me importa mais uma perspectiva qualitativa. Quem estava lá, estava pra valer. Participou com atenção, fez pergunta, debateu. Tive a satisfação de ter alunas da graduação em museologia acompanhando o evento o dia todo. Sem a barganha dos famigerados certificados, sem mercenarizar o aprendizado. Talvez quanto a isso eu ainda me dê por vencido. Aliás, me desdobrei horrores, fiz parte da logística, peça gráfica, divulgação online e boca a boca, insisti com quem precisou, bati foto, passei slide, fiz a minha própria apresentação. Em meio aos percalços me senti meio o Didi naquele filme dos Trapalhões com o Pelé, em que ele fantasticamente bate o corner e corre na área pra cabecear e fazer o gol. Só que no caso nada disso fiz sozinho, contei com meus colegas convidados palestrantes - o Lauro ainda fez as vezes de tradutor consecutivo, com bastante sucesso - com os bolsistas Isac Santana e Hudson Públio, com o apoio da coordenação e da secretaria do PPGCI, diretoria, contabilidade e serviços gerais da ECI. No público não dou conta de mencionar um por um mas sou grato a cada um, e como diz aquela famosa frase do mundo do blues, less is more. Sobre as apresentações em si, depois tento dar uma geral, fazer uma postagem. Abri o evento com uma fala em defesa da UERJ e terminamos com palmas que fazem a gente continuar valorizando e lutando pela universidade pública, pela pesquisa, ensino, extensão, pelo patrimônio cultural, pela arte e pela criatividade do nosso povo. Obrigado a todos que ajudaram.
 



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