Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.

22 de julho de 2013

Sonhando com outra cidade

Impossibilitado de comparece ao imperdível show 10 anos de A outra cidade [confira reportagem do Hoje em Dia aqui e de O tempo aqui], em razão de ter viajado para participar do Simpósio Nacional da ANPUH em Natal - e de ainda não ter sido inventado o teletransporte - só posso daqui desejar o melhor aos meus amigos / parceiros Kristoff Silva, Makely Ka e Pablo Castro + todos os músicos convidados, um grande show. E dizer que continuamos todos nós sonhando com outra cidade. Nessa cidade (Alteria pode ser seu nome)  o Andante chega sempre ao seu destino. Numa casa de forró, um migrante nordestino toca Xote polaco na sanfona, todo mundo dança. Um estudante, sentado na parada de ônibus, pensa na vida e decide que, de agora Em diante... Do outro lado da rua para um rapaz que lê uma carta, aquela que confirma sua Intuição e o faz rever seus conceitos sobre o amor. Mal sabe ele que Perto daqui passa uma Mulher (vinda) do Norte, aquela que foi salva de Morrer no Mar quando entrou no cinema e ouviu o Tema do mergulhador. Aconteceu no dia em que estava acometida de uma Monotonia gris, pensando em como a delicadeza se desmancha, qual Outra flor de cal. Bem diferente é a menina sentada na esquina que remexe suas Madeixas, tudo pra chamar a atenção, e ficar na Mira do olhar do jovem guerreiro observador das tradições, O chamador tatuado no braço, protegido por um Santo Forte. Mas olha a Volta barroca que a vida dá, justamente esse era o filho de um marinheiro que não tinha porto que prendesse, homem sem deus, adepto do Carpe Diem. Nessa cidade os nexos que ligam as pessoas são paradoxais, mas sua ânsia de ocupá-la e fazer dela seu lugar é Atemporal.


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