Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.
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4 de abril de 2020

Festival de Montreux - 50 apresentações em livre acesso

Em meio a essa tormentosa pandemia do novo há uma quantidade imensa de conteúdos de qualidade ficando disponíveis gratuitamente na rede, como forma de ajudar as pessoas a passar um bom tempo isoladas em casa, e obviamente transformar um problema em oportunidade para promover negócios online de toda sorte. 
Algumas dessas iniciativas são especialmente bem vindas, como a da Plataforma de Streaming Stingray Qello. Entre outros conteúdos sensacionais, está disponível um acervo de 50 apresentações do prestigiado Festival de Montreux [página oficial]. Entre outras atrações imperdíveis, Nina Simone, Santana, Yes, Return to Forever e Ladysmith Black Mambazo.
Para acessar, basta seguir as instruções, e vale ressaltar que a plataforma não fez aquela típica malandragem dos períodos de teste gratuito que já te pedem cartão de crédito. O acesso livre é válido até 04 de maio. 

  1. Acesse stingray.com/FREEMJF1M
  2. Entre com o código FREEMJF1M
  3. A lista dos concertos do Festival de Montreux liberados: stingray.com/MJF

30 de setembro de 2019

Rebolo de laranja pêra Rio

Fui surpreendido por essa estranha censura algo(z)rítmica. Minha postagem, com texto escrito no MEU blog, foi censurada pelo facebook, que me mandou mil alertas de "spam". Fato é que eu canso de compartilhar textos como esse e nada acontece. O Rock in Rio deve ter um acordo com o FB para "limpar" a barra do evento em sua rede. Só por isso eu vou compartilhar de novo, colocando todo corpo do texto aqui, e pediria aos amigos e amigas uma forcinha extra nesse pequeno ato de reafirmação diante de uma medida tacanha.

"Roquinquem, cara pálida? (original de 29/09/2019)
 
O Rock in Rio (RiR) representou, desde o começo, um novo modelo da geopolítica indústria fonográfica muito mais hegemonista e homogeneizador do que das décadas de 1960-70. O quadro maior, muito resumidamente, era o seguinte, um rearranjo do mercado fonográfico internacional, com a redução de "majors", a decisão de padronizar / centralizar mais a produção, de apostar menos, de radicalizar no jabá, de apostar mais no consumidor jovem - aí se alavanca o crescimento das FMs - e concomitantemente, no Brasil, com o decréscimo do volume e do prestígio dos festivais, ficou muito difícil a renovação de quadros da MPB. Os que já tinham algum lastro resistiram. Nos anos 1980 a balança de venda de discos pendem mais aos estrangeiros, nos anos 1990 voltou aos nacionais, mas aí alicerçada na farofa comercial de axé, pagode e sertanejo. 


O RiR a meu ver é sobretudo um evento viralata de grandes proporções, que naquele momento influiu na formação do gosto, especialmente dos jovens daquela época. No imaginário nacional, obviamente, o modelo de festival passou a ser esse, com artistas nacionais abrindo para internacionais, e com a centralidade do rock que naquele momento era o grosso do mainstream pop, fosse qual fosse a "roupagem". Eis a programação completa da primeira edição: 



Houve uma articulação entre coisas acontecendo no mercado internacional e no próprio mercado brasileiro, em que fica evidente o enfraquecimento de uma linha que vinha nos anos 1970, quando num dado momento Chico, Elis, Milton, vendiam num patamar muito mais alto, ocupavam o centro da mídia, etc... Mas com o fim dos festivais brasileiros da canção e a mudança de estratégia das gravadoras, eles ficaram "ilhados" em nichos e o catálogo novo passou a ser menos ousado musicalmente e bem mais colonizado.
Existem estratégias de marketing que são explícitas, e para além delas existe uma hierarquia cultural que é preciso ver além da contabilidade. Coisas como ordem das apresentações, atitudes de bastidores, enfim, um sem número de exemplos em que a construção simbólica foi sempre a de que o nacional era preterido em algum nível. Há vários relatos sobre, ou momentos emblemáticos como o confronto do Carlinhos Brown (que ironia esse sobrenome artístico nesse ponto) com o público que esperava por sei lá que banda.



As marcas são as protagonistas desse modelo de espetáculo globalizado, vide depoimento do empresário Roberto Medina, promotor do evento [link]. Se a gente olhar Copa do Mundo, Olimpíadas, qq coisa assim de porte, sempre serão elas que dão as cartas. Reparem que o que elas mais querem é controle. Vide uma "lei geral da copa". Então, girando mais um pouco o parafuso, é o projeto econômico e político das corporações que promove essa vertente de consumo globalizado padrão. RiR é um produto direto disso. Parece que nos últimos tempos houve uma naturalização daquilo que nos anos 1980 era claro que seriam dos grandes agentes opressores do mundo globalizado, as corporações.Os comerciais dos anos 1980 parecem ecoar em meus ouvidos: "Coca-Cola é isso aí! Hollywood, o sucesso!". 

A aceitação desavisada, por vezes míope, de teorias e estudos que elevam ao suprasumo tudo que se dá no que, por exercício macunaímico, me permito nomear sumariamente de "o micro", leva a equívocos absurdos como o Ivan Valente louvando o início do Rock in Rio pq uma jovem fez uma justa homenagem à Marielle Franco antes de seu show. Nenhuma palavra do nobre deputado sobre a natureza do evento, tampouco sobre a lamentável cena do "Palco Favela" sob luzes de holofote e ruídos emulando helicópteros, numa alegoria da luta de classe em estado de choque ou êxtase - dependendo do lugar no espaço urbano e social o sujeito se encontra. Essa do helicóptero é nível bolsonaro de escrotice destilada [link]. Eis a mais pura miséria da microscópica política. Estamos virando figurantes de um roteiro distópico hollywoodiano de quinta categoria. Eu conclamo um repúdio massivo a esse negócio demente de ficar romantizando favela, e sobretudo no contexto de um festival famigerado como Roquinrio num momento como esse. Precisamos recuperar nossa dignidade.

29 de setembro de 2019

Roquinquem, cara pálida?

O Rock in Rio (RiR) representou, desde o começo, um novo modelo da geopolítica indústria fonográfica muito mais hegemonista e homogeneizador do que das décadas de 1960-70. O quadro maior, muito resumidamente, era o seguinte, um rearranjo do mercado fonográfico internacional, com a redução de "majors", a decisão de padronizar / centralizar mais a produção, de apostar menos, de radicalizar no jabá, de apostar mais no consumidor jovem - aí se alavanca o crescimento das FMs - e concomitantemente, no Brasil, com o decréscimo do volume e do prestígio dos festivais, ficou muito difícil a renovação de quadros da MPB. Os que já tinham algum lastro resistiram. Nos anos 1980 a balança de venda de discos pendem mais aos estrangeiros, nos anos 1990 voltou aos nacionais, mas aí alicerçada na farofa comercial de axé, pagode e sertanejo. 

O RiR a meu ver é sobretudo um evento viralata de grandes proporções, que naquele momento influiu na formação do gosto, especialmente dos jovens daquela época. No imaginário nacional, obviamente, o modelo de festival passou a ser esse, com artistas nacionais abrindo para internacionais, e com a centralidade do rock que naquele momento era o grosso do mainstream pop, fosse qual fosse a "roupagem". Eis a programação completa da primeira edição:



Houve uma articulação entre coisas acontecendo no mercado internacional e no próprio mercado brasileiro, em que fica evidente o enfraquecimento de uma linha que vinha nos anos 1970, quando num dado momento Chico, Elis, Milton, vendiam num patamar muito mais alto, ocupavam o centro da mídia, etc... Mas com o fim dos festivais brasileiros da canção e a mudança de estratégia das gravadoras, eles ficaram "ilhados" em nichos e o catálogo novo passou a ser menos ousado musicalmente e bem mais colonizado.

Existem estratégias de marketing que são explícitas, e para além delas existe uma hierarquia cultural que é preciso ver além da contabilidade. Coisas como ordem das apresentações, atitudes de bastidores, enfim, um sem número de exemplos em que a construção simbólica foi sempre a de que o nacional era preterido em algum nível. Há vários relatos sobre, ou momentos emblemáticos como o confronto do Carlinhos Brown (que ironia esse sobrenome artístico nesse ponto) com o público que esperava por sei lá que banda.



As marcas são as protagonistas desse modelo de espetáculo globalizado, vide depoimento do empresário Roberto Medina, promotor do evento [link]. Se a gente olhar Copa do Mundo, Olimpíadas, qq coisa assim de porte, sempre serão elas que dão as cartas. Reparem que o que elas mais querem é controle. Vide uma "lei geral da copa". Então, girando mais um pouco o parafuso, é o projeto econômico e político das corporações que promove essa vertente de consumo globalizado padrão. RiR é um produto direto disso. Parece que nos últimos tempos houve uma naturalização daquilo que nos anos 1980 era claro que seriam dos grandes agentes opressores do mundo globalizado, as corporações.Os comerciais dos anos 1980 parecem ecoar em meus ouvidos: "Coca-Cola é isso aí! Hollywood, o sucesso!". 

A aceitação desavisada, por vezes míope, de teorias e estudos que elevam ao suprasumo tudo que se dá no que, por exercício macunaímico, me permito nomear sumariamente de "o micro", leva a equívocos absurdos como o Ivan Valente louvando o início do Rock in Rio pq uma jovem fez uma justa homenagem à Marielle Franco antes de seu show. Nenhuma palavra do nobre deputado sobre a natureza do evento, tampouco sobre a lamentável cena do "Palco Favela" sob luzes de holofote e ruídos emulando helicópteros, numa alegoria da luta de classe em estado de choque ou êxtase - dependendo do lugar no espaço urbano e social o sujeito se encontra. Essa do helicóptero é nível bolsonaro de escrotice destilada [link]. Eis a mais pura miséria da microscópica política. Estamos virando figurantes de um roteiro distópico hollywoodiano de quinta categoria. Eu conclamo um repúdio massivo a esse negócio demente de ficar romantizando favela, e sobretudo no contexto de um festival famigerado como Roquinrio num momento como esse. Precisamos recuperar nossa dignidade.

 
 
 
 
 

27 de maio de 2016

O "falso inglês" na BH Beatleweek

Motivado por uma conversa recente com o colega pesquisador e igualmente beatlemaníaco de carteirinha Lauro Meller, que não por acaso encontra-se atualmente em Liverpool fazendo o pós-doutorado, lembrei-me de uma pesquisa em campo realizada no final de 2013, por ocasião da 2a. edição da BH Beatleweek. Esse trabalho acabou sendo apresentado em alguns eventos acadêmicos e foi finalmente publicado esse ano, no artigo que escrevi junto com o Pedro Marra, pesquisador e coautor em várias empreitadas e colega de grupo de pesquisa no Nucleurb/CCNM  da UFMG. O artigo completo, Praças polifônicas: o som e a música popular como tecnologias de comunicação no espaço urbano, publicado na Revista FAMECOS do PPGCOM da PUC do Rio Grande do Sul, pode ser acessado aqui
O trecho que destaco acho bem expressivo da nossa metodologia, da forma como procuramos pensar a articulação entre o espaço urbano e o som  simultaneamente em seus aspectos materiais e simbólicos, e passa de uma descrição mais geral do ambiente (complementada pelas fotografias que tirei) para a análise de uma situação bem particular, ocorrida dentro do evento, para em seguida, na análise, adotar uma perspectiva panorâmica, global, sem contudo descuidar do objeto em seu contexto micro, local:


"Deve notar-se que os quarteirões fechados proporcionam uma acústica adequada da forma como configuram lacunas entre duas fileiras de edifícios que não são altos, mas atuam como paredes. Os bares ou cafés que promovem apresentações de música ao vivo aproveitam-se dessa arquitetura, posicionando palcos improvisados e equipamentos de som dos músicos de costas para as avenidas e para o interior das ruas fechadas, onde estão posicionadas as suas mesas e cadeiras dobráveis. Percebemos, por um lado, um esforço para demarcar os limites da propriedade – o que amplia para o espaço da rua a fronteira do bar e reproduz, portanto, a lógica privada dos espaços comerciais – e marcar o perfil do público que se sentam em suas mesas para comer enquanto conversa e ouve música, e, do outro lado, uma série de práticas que desafiam ou tentam adaptar-se aos limites impostos. O caso da Status parece particularmente significativo:

As divisórias ostensivas de fato reforçam a divisão que de alguma forma já opera ali no quarteirão fechado da Status e do McDonald’s. Os meninos pobres, catadores, moradores de rua, hippies e pedintes ficavam nas margens, embora por vezes se aventurassem em passar entre as mesas e pessoas que estavam em pé na área delimitada por elas em frente aos bares. Em geral para pedir dinheiro ou catar latinhas. Um deles interagiu comigo, um senhor que carregava um saco de lixo nas costas, mas não catava nada. Bebia uma cerveja e ofereceu colocar um pouco no meu copo, mas neste havia pequenos churros que comprara no Fujiama, na esquina seguinte à do quarteirão fechado. Ofereci e ele aceitou um, trocamos sorrisos, e ele seguiu passando no meio das pessoas. Em outro momento, enquanto uma das bandas (Nélson e os Besouros - RS) tocava Twist and Shout, passou por mim um adolescente, descalço, sujo e maltrapilho, tentando acompanhar a canção num “falso inglês” como aquele que utilizam os lavadores de carro “otcheiquirobeibe/ pissensau...[well, shake it up, baby/twist and shout]” e coisas do tipo.[1]

A atividade de catar latinhas assinala uma liminaridade aí, na medida em que as latas são simultaneamente o resto do consumo dos clientes do bar e o ganha pão dos catadores (figura 6). O ‘falso inglês’ por sua vez representa um marcador de diferença. A apropriação realizada pelo jovem que passou por mim demarca a tensão entre o inglês globalizado que circula através de uma canção muito veiculada pela indústria cultural e sua forma “localizada” em que se guarda a sonoridade mas se impõe uma dicção abrasileirada. Ao cantá-la desse modo o rapaz não deixa de assinalar que encontra uma forma de integrar o fluxo global do qual a canção participa, ao mesmo tempo em que se encontra desprovido do capital cultural/social que o habilitaria a estudar inglês regularmente para apropriar-se com precisão do que está cantando. Usamos “localidade” aqui como categoria relacional e contextual, “[...] constituída por uma série de elos entre o sentido de imediaticidade social, as tecnologias de interatividade e a relatividade dos contextos” (Appadurai, 1996, p.178). Neste sentido, ao apropriar-se e “transcultural” em seu contexto o que emite a aparelhagem de som, esse sujeito participa da produção espacial da “localidade” (Appadurai, 1996, p.179)."
[GARCIA e MARRA, 2016]

Fig. 6: Público nas mesas da Status durante a BH BeatleWeek, com palco ao fundo; Plano mais próximo da borda do quarteirão fechado, mostrando artesãs e ambulantes nos bancos de pedra,
14 de dezembro de2013. Detalhe para as grades de separação em 2° plano.
Fotos: Luiz Henrique Assis Garcia





[1] Luiz Henrique Assis Garcia. A. Relato de campo, durante a BH Beatle Week. Praça da Savassi. Belo Horizonte, 14 de dezembro de 2013. 1p.

8 de maio de 2014

A marca de Jair

Jair Rodrigues, sem dúvida um ícone de um momento destacado da história da Música Popular Brasileira, a chamada Era dos Festivais. O que fez depois a mim soa como eco daquela explosão, daquele estouro. Foi, mas deixou ali marca inconfundível que para mim traduz-se melhor em sua forte presença de palco. 
O registro histórico, nas imagens da TV Record, guarda ainda uma curiosidade que vem a calhar com a aproximação do dia das mães. A divisão do prêmio maior entre "Disparada" (canção de Vandré e Théo de Barros interpretada por Jair, que também venceu como "melhor intérprete") e "A banda" (por Chico Buarque, que a interpretou na companhia de Nara Leão) é anunciada e em seguida as mães de Jair e Chico são convidadas ao palco. Fica então mais esta homenagem:

"Prepare o seu coração..."

16 de março de 2014

Pequena passagem pela música popular portuguesa

Navegando em busca de outras terras, outros mares, esbarro com esse texto sobre o Festival da Canção português, realizado pela RTP, sobre o qual não conhecia rigorosamente nada. Lembro-me de encontrar alguns comentários e referências sobre o Festival de San Remo, em pesquisas sobre música popular e mais diretamente nos textos de quem tratava dos festivais brasileiros. Não sana plenamente a lacuna mas me parece uma introdução válida. Escolhi alguns trechos, imagens e canções, mas vale ler todo E antes do adeus - Texto de David Ferreira [completo, aqui

"A imagem é conhecida: em Fevereiro ou Março, as ruas vazias e os cafés cheios de gente para ver em televisores pequenos a grande noite, a preto e branco. E não era por haver só a RTP — era um dia único, marcavam-se jantares para ver e discutir. Havia quem fizesse a sua votação. Alguns incompatibilizavam-se por ver de forma diferente as decisões do júri nacional, repartido pelas capitais de distrito. As crianças decoravam depressa as canções — e imaginavam que durante os 12 meses seguintes nada interessava mais aos adultos do que ouvi-las a repetir as principais. Até vir um novo festival." (...)




"Nunca como nos primeiros 11 anos da prova, os que antecederam o 25 de Abril, o festival representou uma parte tão grande da história da música popular portuguesa. Porque havia então muito menos espectáculos, claro — nem a censura facilitava a sua realização. A perda de protagonismo do festival sobretudo a partir de 1980 é prova da animação do meio a partir dessa altura." (...) "Mas, tratando-se de um concurso de canções — como tantas vezes se repetiu, mesmo que tenha havido casos em que a interpretação e até a orquestração foram decisivas —, importa falar aqui dos autores e dos compositores." (...) 

"A polémica que se segue é a mais dura. Os vencedores são identificados com o antigamente, se não mesmo com o Regime. Sérgio Borges — ainda por cima sem a compensação de uma presença na Eurovisão — torna-se persona non grata para boa parte da imprensa. O país está dividido, a esquerda domina como fazedora de opinião, prevalece a ideia de que tudo é combate político e, à falta de alternativa enquanto dura o Estado Novo, o festival é uma óptima arena para afrontamentos. " (...)

Para o festival de 1973, Fernando Tordo, concorrente vencido ao longo de todos os quatro anos anteriores, mas que chegara a brilhar em 1971 (3.º lugar) com uma música sua e letra de Ary, Cavalo à Solta, traz agora uma canção inesperada: mesmo que cante que “toureamos ombro a ombro as feras”, o tom é brincalhão — não há provocações evidentes nem epopeia. Em vez disso, o humor. (...) E toda esta tourada deu à Tourada a melhor das vitórias: uma estocada funda num meio conservador — que melhor símbolo se podia arranjar do Regime?" (...)


"E Depois do Adeus — apesar da concorrência de José Cid, que a solo ou com os Green Windows colocou três canções (que fariam êxito) nos cinco primeiros lugares — garantiu finalmente em 1974 a vitória que Paulo Carvalho, reconhecido por muitos como uma das melhores vozes (ou mesmo a melhor), já merecia há muito. Mas o passo seguinte da cantiga não seria a Eurovisão: antes — e mais importante — o trecho virava uma das senhas dos oficiais revoltosos na madrugada de 25 de Abril. E depois... lá fora nenhum artista português construiu uma carreira a partir do festival. Fizeram-se versões em línguas estrangeiras de várias cantigas. Mas, ao contrário da Tourada que o Tordo cantou, o festival nunca deu “lucros aos milhões”. Mas era prestigiante e as editoras mais activas queriam ganhar. Se de aposta a longo prazo na carreira dos artistas se tratou, não foi bem apostado: naqueles primeiros 11 anos, ou se apresentaram consagrados a quem a derrota embaraçou ou novos que passado pouco tempo mudavam de editora."




2 de julho de 2012

O homem de Montreux

"Lugar na primeira fila não é para ele. Aos 76 anos, Claude Nobs, diretor e criador do Festival de Jazz de Montreux, gosta mesmo é de ficar nos bastidores, atrás das cortinas. Foi de lá que acompanhou apresentações históricas: de Ella Fitzgerald e Ray Charles a Miles Davis e Sonny Rollins; de Elis Regina e Hermeto Pascoal a João Gilberto e Tom Jobim." entrevista completa aqui

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Estamos em 2016 e acabei de descobrir um canal de You Tube oficial do Festival, achei que valia à pena complementar essa postagem antiga com ele. Como cheguei aí a partir de um vídeo da apresentação do Weather Report em 1976, nada mais justo que incorporá-lo.




Procurando uma imagem para ilustrá-la, acabei pensando que seria interessante também deixar essa pesquisa, que cai direto numa série de  posters.  

Uma pequena amostra: