Espaço que visa divulgar e disponibilizar trabalhos de criação e crítica referentes à MPB e música popular, não apenas para promover o intercâmbio de gostos e opiniões, mas fundamentalmente catapultar o debate sobre o tema.
Cerejas
Silêncio
A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...] Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida." Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.
26 de dezembro de 2011
Fragmento da história do blues
Nessa segunda-feira chuvosa, parada, vendo e ouvindo "Wynton Marsalis & Eric Clapton Play The Blues - Live From Jazz At Lincoln Center" (ter um filho que pede pra ganhar isso de natal, isso sim que é presente!), hipnotisado pela performance dos dois com a banda, pelo repertório que mostra que Clapton é muito mais que um grande músico, ícone da música popular, deus da guitarra, sei lá o que mais. É também um profundo conhecedor do blues em suas várias encarnações e procedências. Algo que é reconhecido por Marsalis, zeloso guardião e enciclopédia das tradições musicais norteamericanas. Ao ver no repertório algumas composições de W.C. Handy, lembrei dos velhos alfarrábios sobre blues que li, junto ao eterno livro de cabeceira "História Social do Jazz" do mestre dos mestres da historiografia mundial E.J.Hobsbawm (que o assinou originalmente sob o pseudônimo de Francis Newton, temeroso de ver sua reputação de historiador sério questionada nos compenetrados e ingleses anos 1950). E acabei achando num velho artigo do qual já falei no blog um trecho em que Handy descreve um bluesman em 1903:
“Um negro magrelo e descontraído que começou a dedilhar o violão enquanto eu dormia.As suas roupas estavam em farrapos, seus pés saíam para fora dos sapatos...Enquanto ele tocava, passava uma faca pelas cordas à maneira dos havaianos, que usavam barras de metal.”
Grande contrasta com a paisagem que descrevi ao final do texto, que um espetáculo como esse de Clapton e Marsalis confirma perfeitamente:
"À medida em que foi se formalizando, se tornou mais universal, alcançou outras sensibilidades, outros públicos. (...) Sua penetração, ainda mais acentuada pela indústria fonográfica, ultrapassou mesmo os limites da América, principalmente após 1940. O bluesman de hoje não é um marginal, mas uma estrela que vende milhões de discos".
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