A noite de hoje está guardada e há de ser glosada nos compêndios da música popular brasileira. Histórias serão contadas sobre os antológicos shows de Zé Miguel Wisnik e Guinga na Mostra Cantautores, digna e pertinentemente coadjuvados por Rafael Martini e Pedro Carneiro, respectivamente. Eu mesmo pretendo ter várias pra contar. Mas até lá hão de surgir instantâneos oportunos e singelos, argutos e espontâneos. Sinto uma profunda necessidade de compartilhar com os leitores do blog este escrito pelo meu parceiro Pablo Castro :
Embebido da experiência intensa e profunda de ter podido estar nessa noite de gala, na estreia da quarta edição da Mostra Cantautores [confira site com programação completa] , em que se apresentaram dois luminares da canção brasileira, dois mestres absolutos , da mesma geração, e em certa medida opostos, em certa medida complementares, José Miguel Wisnik com sua dissecação graciosa da canção e das canções, as suas, loas afiadas como pérolas aos poucos, e as nossas, aquelas entranhadas no inconsciente coletivo do que somos;
Guinga, com seu charme carioca, a um mesmo tempo humilde e malicioso, contando anedotas e destilando outras obras primas absolutas, ora com Aldir, ora com Paulo César Pinheiro. O encontro das duas personalidades fundamentais do desenvolvimento dessa arte nas últimas décadas, talvez ainda mais que os baluartes esplêndidos da década de 1960, se dá num ponto equidistante entre o Atlântico e o Pacífico, ou talvez no ponto exato do centro da Via Dutra, tão representativos são dos ethos paulista e carioca da canção nacional ... e se inscrevem na nossa memória.A apresentação do arrojado e magnífico Rafael Martini, articulando com primor uma música expandida para além da letra, e para dentro dela, conjugada com a abertura de Pedro Carneiro, um cronista que casa Guinga com Rumo, ilustram, sem esforços, o nível das aventuras que a canção brasileira ainda reserva para os que se dignam a cultivá-la, a ouvi-la, e a guardá-la dentro de si, refutando miseravelmente a tese do fim da canção.
A canção popular é a verdadeira epopéia da cultura tupiniquim, e quem não faz idéia de por onde ela passa, está perdendo uma das melhores sensações de pertencer a esse lugar chamado Brasil.
Que essa noite tenha sido um dia 8 de dezembro me parece muito significativo, em que pese a influência de John e a onipresença luminosa de Tom.
--\\//--
Guinga derramou sua canção e derramou lágrimas, fez chorar de chorar e chorar de rir. Para dar um gostinho de sal e doce do que foi a noite: essa história da bigamia, canção necessária, desnecessária, etc., foi um dos pontos altos da noite. Acabei de ver a Salmaso contanto a história também, noutro dia, noutro lugar.
--\\//--
Mais cedo, pensando no show de Guinga na Mostra Cantautores, encontrei essa maravilha de texto do Túlio Villaça [Guinga e a última canção do beco aqui]. E outro dia assisti um pedaço (tá difícil ver coisas inteiras) do show O fim da canção (Wisnik + Nestroviski + Tatit) que também me botou pra pensar nessas coisas. Há de merecer mais reflexão. Não consigo deixar de pensar que sair do beco implica refazer rotas também, não com pés nostálgicos, mas por ser possível retomar caminhos que eventualmente não foram percorridos até o fim. Se ali na frente houver outro beco, que haja. Do que for decantado no caminho, ficará o encanto. Sim, temos uma cena pujante. Como diz o Pablo, Eldorado subterrâneo da canção. A cobertura da imprensa tem que crescer, ampliar, multiplicar. De pouco adianta divulgar o evento e depois esquecer de novo desse manancial que flui forte já há tempos. É preciso construir público, abrir espaço nas rádios, nas tvs, nos palcos. E é louvável, mais que louvável, o trabalho da moçada que toca desde sempre a preciosa mostra Cantautores! Longa vida!
Nenhum comentário:
Postar um comentário