Aproxima-se um evento que sem dúvida será uma mostra fidedigna da pujança da autoria de canções em Belo Horizonte nos últimos tempos. O Palavra Som celebra essa efervescência, seja ao remeter aos 10 anos do Projeto Reciclo Geral ou ao promover o diálogo entre a geração de artistas que se projetou a partir dali e as novas levas de desbravadores dessas "tortuosas trilhas". Curti muito o videozinho (ver) [e agora mais essa a-mostra]. Me emocionou particularmente a notícia do reencontro em palco de Kristoff Silva, Makely Ka e Pablo Castro, trio responsável pelo já antológico A outra cidade (ouça muito), do qual me honra muito ter participado como letrista em duas canções. De quebra ainda estão programadas oficinas na Funarte MG, para tratar justamente da união da palavra com o som.
Ten years ago today...
Falar disso é um dos meus assuntos preferidos, como pesquisador e como autor. Jogo nas duas, como se poderia dizer em linguagem futebolística. Há mais tempo até ficava querendo separar um pouco essas duas facetas, receoso de uma interferir com a outra. Hoje vejo que a interferência é inevitável e benéfica. E às vezes acontece de forma inesperada. Motivado pelo Palavra Som acabei decidindo contar como surgiu uma canção (de fato a última que fizemos eu e Pablo) justamente no contexto de um debate sobre a criação das mesmas. Foi assim...
Nos idos de 22 de fev/2012, o Pablo postou e comentou via Facebook uma entrevista n'O Globo com novos expoentes da cena musical carioca. Em torno de temas como cânone, vanguarda, pop, contexto, transcendência, crítica, mercado, arte, técnica, opções estéticas, políticas, "o eixo", Minas, polêmicas muitas (assunto pra várias postagens futuras), pontuadas por provocações mais ou menos intensas, compositores das várias cenas debatendo. Até meti a colher rapidamente, mas curiosamente foi surgindo uma disposição diferente. Três elementos, dentro da intensa discussão, acenderam o pavio da inspiração. Começou com a expressão usada pelo Pablo para pensar a posição de Minas entre a "profundidade" e a "superfície" (e problematizando um certo binarismo repaginado entre Rio e São Paulo). Talvez sejamos uma ponte oculta, ele escreveu. Deu na hora vontade de ter uma música com esse título. Depois o Flávio Henrique disse que achava que a música diz bem mais que as palavras. Sou de escrever muitas palavras sobre música, mas concordo com isso e aí já estava me sentindo desafiado a fazer justamente uma música. E depois, ainda por cima, Renato Villaça botou que a História iria bater o martelo. O historiador aqui achou a mesma coisa. A comichão converteu-se em dedos ágeis no teclado. Queria colocar as ideias a partir do debate, mas a coisa foi ficando meio enigmática...a letra foi se escrevendo, em torno da ideia de oculto e visível, e a ponte entre opostos, o debate contexto x atemporal e a imagem central é isso, o monolito (trascendência) assiste a estrela cadente (momento) - acho que dá pra entender a "astronomia" da coisa. Ao mesmo tempo é uma imagem que eu puxei de 2001 com o lance do monolito, tinha pensado no filme como cruzamento de vanguarda e atemporalidade. E no fim a história continua... (aliás, parei por aqui porque senão é como contar o fim do filme para quem vai ler/ouvir). Bem, como fiz a letra e depois o Pablo pôs a música, aqui vai nessa ordem também (daqui uns dias arrumo com a música):
Ponte oculta
A ponte oculta
do canto que partiu
a parte alguma
da nuvem que pariu
do céu ao chão a chuva
que lava a superfície nua
da rua
que leva ao oceano solo
da lua
um monolito transcedente
assiste a estrela cadente
e a história continua
A ponte oculta
da linha que cerziu
a tela rôta
a outra que emergiu
pincel a mão a luva
que pinta o sol fenol na finda
esquina
que limpa a poeira fina da
ruína
um monolito transcendente
assiste a estrela cadente
e a história continua
A ponte oculta
do canto que partiu
a parte alguma
da nuvem que pariu
do céu ao chão a chuva
que lava a superfície nua
da rua
que leva ao oceano solo
da lua
um monolito transcedente
assiste a estrela cadente
e a história continua
A ponte oculta
da linha que cerziu
a tela rôta
a outra que emergiu
pincel a mão a luva
que pinta o sol fenol na finda
esquina
que limpa a poeira fina da
ruína
um monolito transcendente
assiste a estrela cadente
e a história continua
Nenhum comentário:
Postar um comentário