Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.
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3 de abril de 2019

Entre cordas, paralelos e meridianos: Toninho Horta e Pat Metheny


Como de hábito, excelente análise do meu parceiro Pablo Castro das relações geopolíticas, simbólicas e materiais que perpassam o intercâmbio entre os músicos populares. Através desse caso exemplar e um inevitável paralelo, enseja a reflexão sobre o que é ser mineiro e brasileiro no mundo, e as respostas que a música popular encontra para esta pergunta candente.



O caso da influência mineira na música de Pat Metheny é ilustrativo da nossa condição de periferia-tesouro: o guitarrista americano ouviu nos discos de Milton Nascimento o talento incrível de Toninho Horta na guitarra. Bebeu na fonte, ouviu tudo que pôde, tirou as harmonias, veio ao Brasil, conheceu Toninho, fez uma participação no segundo disco do brasileiro. Absorveu o timbre, o estilo, a capacidade de mesclar, na improvisação, frases junto com voicings, visitou a esquina do Clube da Esquina, trouxe a banda toda, inclusive o incrível tecladista Lyle Mays. Chegou a dizer que gravaria um disco com Toninho, mas a história morreu.

O artista americano é mais virtuoso, com recursos atléticos, e mais eclético, e sua obra abraça um leque ampliado de estilizações. Mas a influência da Toninho está clara em todos os seus principais discos posteriores ao seu encontro com o mestre brasileiro, a começar pelo timbre de guitarra, e pelos toques harmônicos que aprendeu com Toninho. Embora ele tenha citado Toninho em algumas entrevistas, a impressão que se tem é que ele cita menos do que devia. Lembra um pouco a relação de Stan Getz com João Gilberto e Tom Jobim ...

Pat se tornou um dos artistas de música instrumental mais bem sucedidos de todos os tempos, seus shows são caros e concorridos, e ele goza de um prestígio internacional raro. Ele tem o mérito de ter feito música instrumental que flertava com o pop mas não perdia seu conteúdo harmônico melódico, e onde a exuberância de sua improvisação se dava de maneira natural. Trata-se de uma música 'oceânica', que remete ao território inaugurado por Toninho Horta e os mineiros do Clube da Esquina.




Toninho também se beneficiou dessa relação, conseguiu abrir um caminho no mercado internacional , iniciou uma série de discos elegantes na gravadora Verve, e hoje é condecorado em Berkley e roda o mundo com grande frequência, embora prefira morar no Brasil, para a nossa felicidade.

Entretanto, no mundo hierárquico da música instrumental, inclusive entre a maior parte dos instrumentistas brasileiros, fica a impressão de que Pat é maior que Toninho. Evidente que não concordo com isso não apenas pela precedência do brasileiro, mas porque sua composição me parece bem mais consistente, brilhante , incisiva , do que a do americano. As composições de Toninho estão repletas de autoralidade e novidade, as de Pat, nem tanto. É só comparar disco a disco a qualidade das composições, pra mim fica patente que o Toninho é mais compositor.

Por outro lado, os discos de Toninho tem menos variedade estilística, enquanto os de Pat tem mais abertura a estilos variados. A música americana sempre foi muito mais interessada em "impressionar", no sentido de afiar uma performance e uma sonoridade que não deixe dúvidas e normalmente não deixa muito espaço para o devaneio. Já a música brasileira é menos direta, menos impositiva, mais reflexiva, e portanto menos formatada para o mercado. Porém, me parece mais frutífera a longo prazo. Não me entendam mal , Pat Metheny é um monstro, um grande artista, porém suspeito que alguns dos seus discos envelhecerão mais rapidamente enquanto os de Toninho permanecerão pertinentes por muitos e muitos anos.
Por Pablo Castro

5 de março de 2018

Na estante: Le Grand Tango

Meu deleite do momento é essa magistral biografia de Piazzolla, que adquiri numa banca de rua na feira cultural no bairro de San Telmo, em Buenos Aires, no final do ano passado. Nos dias em que estive por lá, ir ouvindo a música enquanto lia a biografia em pleno centro de Buenos Aires dava uma sensação ímpar a tudo. Le Grand Tango: the life and music of Astor Piazzolla, escrito pela argentina María Susana Azzi (da Academia Nacional de Tango e da Fundação Piazzolla)  e pelo estadunidense Simon Collier (latinoamericanista e professor da Universidade Vanderbilt). Pesquisa de fôlego (5 anos), entrevistas, material de arquivo, texto agradável, análises decentes, sem medo de usar termos técnicos mas conseguindo dar a ideia a qualquer leigo, detalhes curiosos - por exemplo, Piazzolla quando adolescente conheceu Gardel em Nova Iorque e quase esteve na sua trupe como ajudante na viagem à Colômbia que matou o grande ídolo argentino. Que vida movimentada e que figura foi Piazzolla. Ler uma biografia dessa modifica totalmente a forma de ouvir a música do artista biografado. 







"Quando você se casa com a música , ela é seu amor para sempre, e você vai para o túmulo com ela". Piazzolla!

P.S.
Um dos pontos altos do livro é a passagem de Piazzolla pelo Brasil em 1972, quando Nana e Dori Caymmi o levaram para ver o show de Milton Nascimento no Rio - à época do disco Clube da Esquina. Na sequência o argentino e seu conjunto tocaram num espaço privado para uma plateia de músicos brasileiros que incluiu, além do trio já mencionado, Chico Buarque, Egberto Gismonti, Luiz Eça e outros. Após a reunião de depoimentos e casos dessa passagem, fica inclusive a sugestão dos autores para que se escreva um livro devotado às conexões de Piazzolla com a cena musical brasileira, reforçada pelo relato de um diálogo entre ele e Caetano, no qual ele indaga ao baiano porque não o tratam na Argentina como o Brasil lhe trata.

P.S. 2 - acrescento essa entrevista que traz vários assuntos tratados no livro e acabei de assistir por indicação do músico argentino Lisandro Massa. 

 

25 de setembro de 2015

Meio de campo

Acompanhei na noite de ontem o último espetáculo da série do projeto "Meio de Campo", iniciativa que considero a mais importante a ser sediada no Cine Teatro Brasil desde a exposição "Guerra e Paz" que marcou sua reabertura ao público. Entre tantos afazeres gostaria muito de deixar algum relato a respeito, mas eis que se antecipa a mim o caríssimo João Marcos Veiga, jornalista bem formado, que também tem a música nas veias e brevemente defenderá uma dissertação de mestrado em História sobre a Rua da Bahia, em cuja banca estará, com enorme prazer, este que vos escreve. Sendo assim, sem mais, o vivo texto do João, que gentilmente o cedeu para o blog:


"Impossível não sair transformado depois de um show como o de ontem, que promoveu o encontro entre o quarteto de Alexandre Andrés e Egberto Gismonti [matéria sobre o show, aqui]. Como disse o próprio Gismonti, uma música feita com carinho, afeto e entrega - além de muito talento, claro. Curiosamente, os contratempos da noite tornaram a apresentação ainda mais ímpar e saborosa. Após servir ao toque magistral de Rafael Martini, eis que o piano tem seu "martelo" quebrado bem no momento de receber o mago. Sussurros tensos sob os holofotes e nos bastidores, eis que cruza o palco, sem qualquer cerimônia, o afinador, seu Guido, com sua fiel irmã e assistente com a maletinha de primeiros socorros musicais. Enquanto a apresentadora Brisa Marques põe toda sua simpatia comunicativa à prova (com imensa competência), o velhinho inicia a operação. E com o piano com todas as entranhas à mostra, o quarteto ainda fez um arrebatador tema de saída, desta vez com Martini ao violão. Intervalo forçado de 25min para colocar o instrumento e suas teclas no eixo. Apreensão por parte da plateia? Que nada. Depois das boas risadas com Brisa, o momento cai bem para um bate-papo no saguão e para comprar Macaxeira Fields, álbum de Alexandre, das mãos do pai coruja, ninguém menos que Artur Andres, do Uakti. Devidamente reacomodados nas poltronas do Cine Theatro Brasil, encaramos a performance de Gismonti ao violão, evidenciando todo seu virtuosismo e quebras de linguagens formais de expressão musical. Mas é ao piano que o mago nos leva a outra dimensão, tempo suspenso, música das esferas. Quando já nos dávamos por satisfeitos, no meio de um tema surreal surgem inesperadamente quatro rapazes no palco girando canos conduíte, agregando um som no mínimo mágico àquele momento. Mas o melhor ainda estava por vir. Juntos, os cinco formaram uma única entidade musical, de imensa complexidade, beleza e inventividade. Parecia que o tempo tinha parado, tanto que nem me dei conta de que já tinham se passado quase três horas e meia desde o início do espetáculo. De Gismonti não esperava menos, mas foi um privilégio ver a entrega do quarteto de Alexandre Andrés (com Martini também ao acordeon, Trigo com sua elegante condução de baixo e Adriano Goyatá numa aula de dinâmica e criação de texturas percussivas). Com a pouca desenvoltura do jovem artista mineiro com as palavras (e nem precisa) e o pouco interesse do renomado carioca com palavras que também pudessem agradar a plateia, estivemos diante não de um "projeto", ou de um espetáculo de entretenimento, mas sim testemunhamos unicamente a música em sua plenitude, esta sim, transformadora. Parabéns ao Meio de Campo pela produção, pelas escolhas certeiras na curadoria de todas as etapas do festival e por nos proporcionar um momento que faz jus às leis de incentivo, com um show de alto nível e realmente com preço popular (meia-entrada a R$10)." por João Marcos Veiga


7 de junho de 2015

Paulo Moura na Mangueira


Paulo Moura - short film 35 mm - by Paulo Martins from Paulo Martins on Vimeo.



Legenda do vídeo:
Filmado no Morro da Mangueira, RJ; o saxofonista, clarinetista, maestro e arranjador Paulo Moura conta fatos da sua vida e apresenta algumas músicas.

Apresentado no V Festival Internacional de Curtas, SP, 1994
4 semanas em cartaz no Cine Veneza, RJ, em complemento do longa metragem The Art of Love, Arthur Rubinstein, de François Reichenbach.

Produzido por: Flávio Tambellini
Fotografia e direção: Paulo Martins


Música:
Diálogos, Vigor e Bicho Papão (Paulo Moura); Moto Perpétuo (Paganini) ; Fantasias (Villa-Lobos); As rosas não falam (Cartola).
 

30 de maio de 2015

O contemporâneo em outro tempo

Minha patente preferência pela canção, que justifico em parte pelo imenso peso histórico e cultural dessa forma em terras brasileiras, em parte pela questão de ofício mesmo, faz uma pausa para divulgar essas pérolas que encontrei nas errâncias pelo mar digital, a partir de um link postado num grupo de facebook dedicado ao Clube da Esquina pelo Matheus José Mineiro (agradecimento!). Trata-se dos discos de Nivaldo Ornellas e Robertinho Silva para a série M.B.P.C.

"Entre 1978 e 1981, através da série M.P.B.C. - Música Popular Brasileira Contemporânea, a Phonogram-Polygram se propôs a mostrar a gama diversificada de tendências a época reveladas na música instrumental feita no Brasil, por profissionais instrumentistas, compositores e arranjadores, dispostos a encontrar o seu espaço dentro da música popular brasileira, ampliando o seu campo de ação e reconhecimento. O mais interessante dessa série foi mostrar a música instrumental brasileira como uma expressão artística disposta de contemporaneidade, uma forma de arte contribuinte para a contemporaneidade da época -- inclusive como uma arte gráfica muito bem elaborada por um artista da época chamado Aldo Luiz. Bico de Pena. O produtor Roberto Santana Aramis Millarch conta, em entrevista, como funcionou a empreitada. Apesar da subsidiária da Phillips ser uma empresa que visava o lucro, o lançamento da série acabou  funcionando mais como forma de engajamento documental do que como forma de se obter lucros consideráveis, haja vista a música instrumental brasileira não ter um mínimo da competitividade comercial de um álbum de Roberto Carlos, por exemplo. Atualmente, os poucos exemplares que sobraram da tiragem limitada lançada pela Phonogram-Polygram são raríssimos ítens de colecionadores ou pepitas perdidas em sebos e casas de vinis usados. Ao todo, foram gravados 11 álbuns." da apresentação do Wozzeck Magazine, blog criado pelo músico e pesquisador musical Vagner Pitta. [completo, aqui]

Talvez "contemporâneo" seja um dos conceitos mais truncados e flexíveis que se aplica desde a modernidade. Na nossa forma particular de experimentar o tempo, ele se recobre com diferentes acepções. A princípio, nos lança a ideia de simultâneo, concomitante, daí pensarmos o contemporâneo associado ao presente de quem o identifica como tal. Entretanto, se o contemporâneo é tomado de um ponto de vista comparativo, no regime de historicidade tipicamente moderno que identifica no progresso o modo preferencial de perceber o tempo, é possível criar a sensação que ele remete à novidade, à emergência do amanhã dentro do hoje. O contemporâneo, na série em questão, remete a esse "ar de novidade", traduzido por exemplo na parte gráfica, nas letras com tipos "computadorizados" e desenhos remetendo a paisagens fantásticas. Assim, numa percepção fatiada e escalonada do tempo foi possível considerar o "contemporâneo" como sucessor do "moderno". Daí provavelmente se depreende essa leitura, quando se fala em arte, por exemplo, embora surge imediatamente a dificuldade a partir da vertiginosa transformação na experiência social que inclui o fenômeno da "compressão do espaço-tempo" que tornou problemática a concepção progressiva tipicamente moderna. Assim, curiosamente, sob esse ponto de vista podemos identificar um "contemporâneo" datado, que desde o nosso presente se localiza no passado. Contemporâneo torna-se um termo ambíguo, porém talvez esteja aí a qualidade que lhe permite continuar circulando pelas bocas e cabeças. Poderemos eventualmente considerar, desde as possibilidades de apropriação que detemos num dado momento, que essa música soa com "atualidade" para nossos ouvidos.


Ficha técnica:
NIVALDO ORNELAS - Série MPBC
1978 Phonogram (6349 375)

1 - As Minas de Morro Velho (Cid Ornelas - Nivaldo Ornelas)
2 - Portal dos anjos (Roberto Fabel - Nivaldo Ornelas)
3 - Arqueiro do rei (Nivaldo Ornelas)
4 - Ninfas (Nivaldo Ornelas)
5 - Querubins e Serafins (Nivaldo Ornelas)
6 - Sorrisos de uma criança (Nivaldo Ornelas)
7 - Cidadela (Jairo Lara - Nivaldo Ornelas)
8 - O que há de mais sagrado (Nivaldo Ornelas)

arranjos e regência - Nivaldo Ornelas
arranjo da faixa 4 - Wagenr Tiso

Nivaldo Ornelas - saxofone tenor e flautas
Mauro Senise - flautas
Raul Mascarenhas - flautas
Cacau - flautas
Zé Carlos - flautas
Ricardo Pontes - flautas
Jairo Lara - flautas, violão de aço
Aécio Flávio - flauta doce
Marcio Montarroyos - piano, flugel horn, mellowphone
Wagner Tiso - piano acústico e orgão na faixas 5 e 8
Helvius Vilela - piano acústico e orgãos
Toninho Horta - guitarra e violão
Jamil Joanes - baixo elétrico e violão de 12 cordas
Luis Alves - baixo acústico e percussão
Pascoal Meirelles - bateria e tímpanod
Chacal - percussão
Chico Batera - percussão
Robertinho Silva - percussão
Robertinho Silva - bateria nas faixas 7 e 8.
Paulinho Braga - percussão
Paulinho Braga - bateria (faixas 1 e 2)
Pascoal Ubiratan - percussão

cordas:(Quarteto da Guanabara)
José Alves e Aizik - violinos
Frederick - viola
Watson Cus - cello

coro infantil - Tata, Flavinho, Nana e Carla
coro masculino - Edson Bastos, Max e Waldir Jamil
coro feminino - Suxzana, Nilza, carla e Nana

participação especial - coral da Pro-Arte (regente - Jaques Morelembaum)





Ficha Técnica:
MÚSICA POPULAR CONTEMPORÂNEA (MPBC) - ROBERTINHO SILVA
1981 - LP 1981 Polygram (6328 229 - Série Azul) (azul*09-2003)

Lado A:
1 - A CHAMADA - [3.26] Milton Nascimento
2 - O VÉIO NO SOL -[4.58] Egberto Gismonti
3 - BALAFON - [3.34] Gilberto Gil
4 - SONATA DE BATERA - [6.47] Nivaldo Ornellas

Lado B:
1 - BIÔNICO – [5.24] Jota Moraes
2 - CORAÇÃO - [4.46] Wagner Tiso
3 - FALANGE DOS TAMBORES – [2.46] Robertinho Silva e Nelson Ângelo
4 - SÃO JOSÉ 887- [6.12] Robertinho Silva e Filó

Arranjos
WAGNER TISO - A1 / A3 / B2 / B4
EGBERTO GISMONTI - A2
JOTA MORAES - B1
ROBERTINHO SILVA - B3

Arranjo vocal
NELSON ANGELO - B3
Voz Solo
ALEUDA - A1 / B4
Vocais
DANILO CAYMMI
NELOSN ANGELO
NOVELLI
FERNANDO LEPORACE - B3
Baixo Acústico
LUIZ ALVES
Bateria
ROBERTINHO SILVA
Percussão
ROBERTINHO SILVA - A1 / A3 / B3 / B4
ALEUDA - B4
CIDINHO - A3 / B4 / B3
NANA VASCONCELOS - A4
LUIZ ALVES - B3 / B4
NOVELLI - B4
CHICO BATERA - B3
UBIRATAN A3 / B3
Violão
EGBERTO GISMONTI - A2
Piano Elétrico
ANDRE DEQUECH A4
WAGNER TISO - A1 / B2 / B4
MARCOS RESENDE - A3
Piano Acústico
EGBERTO GISMONTI - A2
JOTA MORAES - B1
WAGNER TISO B2 / B3
Sax Alto
MAURO SENISE - B1 / B2
OBERDAN - A2 / A3 / B4
Sax Tenor
RAUL MASCARENHAS - B2
ZÉ CARLOS - A2 / A3 / B4
Sax Barítono
LEO GANDELMAN - A2 / A3 / B4
Flautas
MAURO SENISE - A2 / A3
ZÉ CARLOS - A3 / B4
Sax Soprano
NIVALDO ORNELLAS - A4
RAUL MASCARENHAS - B2
Trompete
PAULINHO - A2 / A3 / B4
BIDINHO - A2 / A3 / B4
Trombone
SERGINHO - A2 / A3 / B4
RAUL DE SOUZA - B4
Cello
JAQUES MORELEMBAUM - A1
Marimba
JOTA MORAES - A3
Guitarra
RICARDO SILVEIRA - A3 / B1
HELIO DELMIRO - B2

Obs: A música "Falange dos Tambores" foi baseada em "Maria Três Filhos" música de Milton Nascimento e Fernando Brant. A música "São José 887" é dedicada a Moacir Santos
Agradecimentos Especiais a Wagner Tiso, Luis Alves, Paschoal Meireles, Chico Batera, Loca, Túlio Mourão, Aleuda e a todos os músicos que participaram deste LP.


1 de fevereiro de 2014

O outro lado do Grammy

Assisti, erraticamente, à cerimônia do Grammy 2014, basicamente pela presença de Paul McCartney e Ringo Starr. Pois depois de ver o Ringo e os veteranos da All Starr Band tocarem Photograph, fazendo seu som de forma digna e apresentando-se de modo a colocar a música em primeiro plano, assistir a pirotecnia e encenação de "artistas" quem não tocam e não cantam nada foi um verdadeiro castigo, do qual tentei me poupar o melhor que pude. Tanto que perdi os dois juntos no palco tocando Queenie eye rsrsrs e celebrar os 50 anos do início da invasão britânica. Depois vi pelo You Tube, antes que os donos dos direitos do evento saíssem bloqueando. Enfim, é um negócio da indústria cultural com N, nem compensa render muito em cima disso não.  Acontece que o Trio Corrente, um dos mais prestigiados da música instrumental  brasileira atualmente, levou junto com Paquito D'Rivera o troféu de melhor álbum de jazz latino pelo CD “Song For Maura”. O que não foi devidamente noticiado, inclusive porque ocorreu naquele limbo das premiações paralelas. Acabei lendo a matéria escrita por Kiko Nogueira [completa, aqui], que chamou-me a atenção por conter o relato do pianista Fabio Torres, que "contou o que é ganhar um Grammy sem que ninguém note muito". Um relato vivo e sincero que transcrevo porque é um jeito de ver o outro lado da coisa:

Eu, o baterista Edu Ribeiro e o baixista Paulo Paulelli fazemos música instrumental brasileira, tocando basicamente os grandes autores do choro, do samba e da bossa, como Jobim, Pixinguinha e Baden, e também nossas próprias composições. Escrevo sob o impacto do prêmio por nós recebido no dia 26 de janeiro, o Grammy de melhor álbum de jazz latino, pelo CD “Song for Maura”. Esse trabalho foi fruto de uma parceria entre o Trio Corrente e o saxofonista cubano radicado nos EUA, Paquito D’Rivera. Muita gente me disse: “Eu assisti a cerimônia do Grammy na TV e não vi vocês lá”. É bom esclarecer que além dessa premiação televisionada que reúne as grandes estrelas do Pop, num teatro menor ao lado do imenso Staples Center é realizada uma outra cerimônia que entrega 72 Grammys para as mais diversas categorias como jazz, gospel, música clássica e outras.
Pois bem, é aí que estão incríveis grupos de música de câmara, compositores e intérpretes de música erudita, bem como alguns dos jazzistas mais conceituados dos EUA e do mundo.  Vimos alguns de nossos ídolos ganhando ou perdendo seus prêmios na nossa frente. E, esperamos 40 categorias – mais ou menos 2 horas – até chegar nossa vez. Apenas um brasileiro havia faturado essa categoria até hoje, nosso maestro Tom Jobim em 1996.
Eu fiz de tudo pra fugir do espírito de competição, exorcizar o terrível “winners and losers” dos americanos. Mas o fato é que foram duas horas da mais terrível angústia. E o instante em que anunciaram nosso nome foi algo indescritível. Sim, é um pouco piegas, mas foi exatamente isso. Uma mistura de alívio com extrema felicidade. Pensei também na enorme e artificial distância que nos separava dos outros indicados preteridos. Após nos tornarmos “Grammy Winners” nos tiraram da platéia e nos levaram pra sessões de fotos e entrevistas enquanto os outros eram como que abandonados à própria sorte.
Logo depois fomos ao Staples Center assistir a premiação das estrelas do pop, rock, country, rap etc. Eu estava acompanhado de minha filha e entramos pelo tapete vermelho junto com dois caras com roupas de robô. Também havia muitas luzes e burburinho mas sou completamente ignorante em matérias de ícones pop. Minha filha acha que no centro de uma rodinha muito agitada pela qual passamos estava a Madonna…mas podia ser a…Taylor Swift??
Vimos de pertinho o Paul e o Ringo, o Stevie Wonder e uma negra muito, muito linda que, há pouco descobri, se chama Beyoncé. Claro que, para ouvidos de músico experiente, foi fácil identificar muitos artistas sem nenhuma substância musical, alguns inclusive sendo consagrados e que serão vítimas da efemeridade inclemente. Assim como foi fácil perceber o porquê de alguns veteranos fazerem sucesso durante tanto tempo, tal a verdade de sua arte.
Toda essa experiência inusual me fez pensar muito sobre a música, o sucesso. Pensei na distância que separava a nossa música da música daquelas estrelas. Pensei na estrutura imensa, paquidérmica, que move essa fábrica de celebridades e no quanto, cada vez mais, essa estrutura será ameaçada pela multiplicidade de vozes que a internet traz. 
Muitas pessoas se queixaram da ausência do Trio Corrente na televisão brasileira, na noite da premiação. Achavam que deveria ser destacado o fato de artistas brasileiros serem premiados. Estarei sendo sincero em confessar que isso não diminui nem sequer uma ínfima fração de meu contentamento. Não tenho televisão em casa e tive a sorte de conhecer uma moça que também não tinha e me casar com ela.

Trio Corrente & Paquito D' Rivera
Festival Internacional de Jazz de Punta del Este - Uruguay
Janeiro de 2011

Paquito D'Rivera -clarinete
Fabio Torres - piano
Paulo Paulelli - contrabaixo
Edu Ribeiro - bateria
 

14 de dezembro de 2013

Grandes encontros da música popular - Egberto e Hermeto

Antes que algum desavisado imagine coisas, não se trata da mais nova dupla sertaneja universitária.  São, de fato, o Gismonti e o Pascoal, dos músicos mais inventivos e inclassificáveis que essas terras brasileiras já deram de dar. A série grandes encontros não poderia perder essa oportunidade, mesmo considerando que a música desses dois atravessa várias fronteiras e de forma alguma se limita à classificação de popular, ainda que transite por ela. No reconhecimento disso, lanço mão de expediente que já se tornou habitual, que é pinçar os excelentes comentários do meu parceiro Pablo Castro:

Um dos enigmas da grande música instrumental brasileira sempre foi, para mim, nunca ter ouvido Egberto e Hermeto juntos. Não só porque os considero os dois maiores nomes pós- década de 1960, tanto como compositores quanto como instrumentistas, nem apenas porque os considero duas escolas diferentes, e igualmente majestosas, Egberto mais cerebral, e Hermeto mais dionisíaco, mas pelo fato de que são da mesma geração, filhos da revolução da bossa nova e do ensino de músicas nas escolas durante as décadas de 40 e 50 cuja implantação se deu pelas próprias mãos de Villa-Lobos.
Eis que achei aqui esse raríssimo encontro de gigantes, cujos nomes até rimam, num festival de jazz europeu em 1975.



Com a preciosa contribuição de Maurício Ribeiro, acrescento essa entrevista dada pelo dois, em companhia do também imprescindível Naná Vasconcelos, quando estiveram juntos na Argentina. Rápida e certeira.




Aproveito o clima natalino, tempo propício para anunciar que já acertamos novas bases para esta colaboração, e em breve os leitores do Massa Crítica MPB vão ter gratas surpresas...