Cerejas

Silêncio

A Câmara Municipal está tratando de abolir os barulhos harmoniosos da cidade: os auto-falantes e as vitrolas. [...]
Gosto daqueles móveis melódicos e daquelas cornetas altíssonas. Fazem bem aos nervos. A gente anda, pelo centro, com os ouvidos cheios de algarismos, de cotações da bolsa de café, de câmbio, de duplicatas, de concordatas, de "cantatas", de negociatas e outras cousas chatas. De repente, passa pela porta aberta de uma dessas lojas sonoras e recebe em cheio, em plena trompa de Eustáquio, uma lufada sinfônica, repousante de sonho [...] E a gente pára um pouco nesse halo de encantado devaneio, nesse nimbo embalador de música, até que a altíssima farda azul marinho venha grasnar aquele horroroso "Faz favorrr, senhorrr!", que vem fazer a gente circular, que vem repor a gente na odiosa, geométrica, invariável realidade do Triângulo - isto é, da vida."
Urbano (Guilherme de Almeida), 1927.

10 de janeiro de 2012

Os números da indústria da música e as formas de consumo

Não sou propriamente um pesquisador ligado em números, mas também não posso dizer que os ignoro por completo. Acabei de dar uma sacada no relatório da Nielsen e da Billboard para 2011, verdadeiro raio-x da indútria fonográfica no período, ainda que se deva considerar que é cheio de viéses, com sua lógica centrada nos padrões norte-americanos de consumo e sucesso (tudo está organizado em top ten, por exemplo, e geralmente no patamar dos milhões). Meu interesse foi despertado por essa pequena nota no Estadão (Venda de músicas volta a crescer), cujo tópico central é a superação das vendas de álbuns digitais em relação aos álbuns físicos. "Do total de álbuns vendidos, 50,3% são digitais. A venda de discos digitais atingiu 1,2 bilhão de unidades, um aumento de 8,4% em relação a 2010".  Outro dado notável é o aumento das vendas em vinil, atingindo 3,9 milhões. Nesse suporte o disco mais vendido foi Abbey Road, e o artista mais vendido a banda Radiohead.  A campeã dos números foi a cantora Adele (deixando para trás Lady Gaga e Justin Bieber), com 5,8 milhões de álbuns vendidos, sendo 1,8 em versão digital, a maior vendagem até hoje. E teve também 16 mil cópias vendidas em vinil. Sua canção  Rolling In The Deep obtve 5,8 milhões de downloads.  Outro dado interessante é que o aumento percentual maior é para os álbuns de catálogo "profundo" (os que estão há mais de 3 anos à venda).  O consumo de faixas digitais aparece claramente concentrado, na divisão de vendas por década, na música  produzida neste século (86%).  

Só com esse dado podemos ver que o consumo digital aponta para a lógica da faixa e não do álbum, mas os números mostram crescimento da venda de álbuns, incluindo digitais. Extrapolando o contexto do relatório, vale notar que as gravações chamadas de independentes no Brasil, que muitas vezes circulam por meio da internet, recorrem bastante a esse formato. Assim, o conceito de álbum ainda tem peso cultural entre quem produz e ouve música popular, resta saber até quando...

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